Thiago Calixto, conhecido mundialmente como "Tica", é meu amigo de longa data. Nossa amizade remonta aos remotos tempos do "ginásio", tanto tempo faz que nem se chama mais assim. Tem 27 anos e é bacharel em Direito, atualmente acadêmico do curso de Psicologia na pequena Umuarama, interior do Paraná. Participante pelo terceiro ano consecutivo de projeto de pesquisa em Psicologia Jurídica, bolsista do PIBIC da Universidade Paranaense.
Calixto já teve suas andanças mundo afora, morou um tempo em Londres, Londrina, São Paulo e agora está novamente em Umuarama. E que felicidade a minha em reencontrar esse grande irmão e sabê-lo produzindo literatura. Não poderia deixar de colocá-lo na turma dos malucos literatas da cidade.
Poesia e prosa, a produção desse nosso novo compadre é bem abrangente, de temática diversa e muitas vezes hermética, personalíssima e sempre interessante. Além de ser o novo hortifrutigranjeiro do Culturanja, Tica também publica seus trabalhos no site Recanto das Letras, vale a visita.
Alzheimer
Um dos meus defeitos é não gostar da sensação de impotência diante de qualquer situação. Obviamente uma postura controladora e narcisista, mas enfim. Na leitura da doença de Alzheimer, alguns aspectos me marcaram amargamente: primeiro, por ser a causa mais comum de demência entre adultos, o que a princípio seria caso de preocupação individual não o é, mas sim um problema de saúde pública; segundo, por ser um mal degenerativo, letal e incurável, daí minha angústia descrita na primeira linha do ora discutido; terceiro, pelo fato de atacar a memória e as habilidades motoras, o que, em uma análise não científica, é capaz de embargar a voz e encher os olhos d’água.
Na minha escala de valores tenho a liberdade como nosso segundo bem maior, logo abaixo da própria vida, embora com certas condições. E quando leio “destruição de neurônios”, e conseqüente perda de memória, penso em dependência, em grilhões. Imagino a pessoa presa em sua própria alienação, desconhecendo amigos e parentes. Isso me remete à película “Mar Adentro”, a qual retrata, em seu momento derradeiro, a personagem portadora de uma doença degenerativa que não se lembra do grande amor de sua vida. Recebe de uma amiga uma carta do homem que transformou a sua vida, embora não saiba mais quem ele era. Perco-me em devaneios acerca desta questão. Vinícius de Moraes, nosso “poetinha”, dizia que a vida é a arte do encontro. O quão triste deve ser não recordar os momentos belos vividos, as pessoas maravilhosas encontradas no caminho, os lugares fantásticos outrora visitados. Mais penoso talvez para aqueles que amam o portador da doença, o que não deixa de ser doloroso para alguém.
A afetação da habilidade motora é outro aspecto crucial, posto que o enfermo, em sentido conotativo, volta a ser uma criança de colo, na senda de que necessita todos os cuidados triviais, como por exemplo, vestir-se, alimentar-se. Aqui vislumbro também a dependência dita a pouco, que torna o homem privado de autonomia sobre sua vida. Vem à cabeça a imagem fantasiosa de um cérebro, no qual cada emaranhado é uma pessoa amiga, uma reminiscência saudosista, um lugar de se conhecer nas férias, e o mal de Alzheimer seria como uma espécie de incêndio que se alastra, queimando tudo isto. É como se Deus retirasse a pessoa de seu interior, levando-a para junto dele e só deixasse o invólucro sem vida. Um indivíduo que apenas respira, contudo não se recorda dos suspiros.
6 comentários:
Bem vindo, hermano Calixto!!!
Texto medonho.
Por favor, alguem mande esse cara ambora...
rsrsrsrs...
bem bom o texto!!!
parabéns, Calixto!
e que venham outros!
Eita Tica, mais uma vez meus parabéns! Você consegue descrever com muita precisão o sentimento que envolve os que convivem com um paciente com Mal de Alzheimer... Na minha opinião, é uma das doenças mais tristes, e com certeza a que mais temo. E você, com sua clareza de idéia e de opiniões conforto os que o lêem. Mais uma vez muito obrigada por compartilhar conosco as suas obras!
Um grande beijo com carinho e saudade
Ana
Terminou com chave de ouro esse texto. Li, entreguei-me, e me fez pensar: para onde vai esses pensamentos? ... Mistério é o que não falta nessa vida!
Parabéns. Abraço.
Sensacional, Thiagão. Poesia em prosa, coração em crônica. Texto afiado como faca, direto na alma. Vivi muito próximo do Alzheimer em minha juventude, acompanhando os anos terminais da Vó Alda e posso dizer que é muito triste. Parabéns pelo texto!!!
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